O dia está solarengo. Há que aproveitar bem porque este seria o único
dia de sol que apanharíamos na nossa “road trip” pela Islândia. E mesmo assim
não podemos dizer que foi um dia. O mais correcto é dizer que foi uma tarde e
uma manhã, cerca de 24 horas.
Na Islândia passamos os dias a correr. Levantávamo-nos bem cedo para
aproveitar bem os dias e, como somos muito ambiciosos com as coisas que
queremos visitar, terminávamos sempre por volta das 21h ou 22h. A essa hora,
chegávamos ao campismo, montávamos a tenda, cozinhávamos e pouco depois caíamos
redondos no saco-cama. A cama até pode ser dura mas o corpo está moído e já não
sente nada. Assim que entrávamos no saco-cama quase nem tínhamos tempo de dizer
boa noite um ou outro. Se um se deitava mais rápido, quando o outro se deitava
já o encontrava a dormir. Os sacos-cama quentinhos faziam maravilhas e depois
de uma noite bem dormida (ainda que raramente mais do que 5 horas), estávamos
prontos para mais um dia de aventuras.
Já levávamos vários dias de viagem quando chegamos à região vulcânica
de Krafla e Myvatn. O sol iluminava o horizonte e coloria de tons alegres a
paisagem. Isto deu-nos uma nova energia e levantou-nos a moral.
Esta região da Islândia é uma das que tem maior potencial energético
proveniente do calor do interior da Terra. Há aqui uma grande central
geotérmica em funcionamento desde a década de 70 e o calor libertado pelo
interior da Terra aquece as casas todas da região de Krafla e Myvatn. Uma das
coisas mais surreais que vimos foi um chuveiro de água quente no meio do nada,
simplesmente abastecido pela água proveniente da actividade geotermal.
Ainda cheirava a terra molhada quando entramos em Leirhnjúkur, a
cratera vulcânica de Krafla, o vulcão que assolou a Islândia no século XVIII.
Leirhnjúkur é um dos lugares mais fantásticos que visitamos na
Islândia. Se tivéssemos que escolher 3 lugares preferidos neste país,
Leirhnjúkur seria certamente um deles.
Leirhnjúkur é verdadeiramente impressionante mas para se ter a noção
real do que aqui existe é preciso deixar o carro no parque e fazer um trek de
cerca de 3 km pela zona da cratera do Krafla e pelas escoadas de lava
solidificadas.
O vulcanismo do Krafla criou “rios” de lava que escorreram pelas
vertentes da cratera, chaminés secundárias, fumarolas e buracos sulfurosos
incríveis. O trilho que fizemos leva-nos inicialmente até aos lagos termais,
com água a ferver e a borbulhar na cratera. Um pouco mais à frente chegamos ao
interior de uma sub-cratera dentro da cratera principal. O solo está tão quente
que se tem que percorrer o trilho sempre pelos locais assinalados. Há inclusive
um sinal na entrada com indicação sobre as tonalidades do solo e que relação
elas têm com a temperatura, tentando assim demover os turistas de fazerem
incursões fora do trilho. Aqui a crosta terrestre é extremamente fina, daí a
temperatura da rocha e a saída constante de vapor de água e gases sulfurosos do
interior da Terra. Parece que estamos a caminhar dentro de um vulcão activo, e,
na verdade estamos mesmo. Esta é uma sensação fantástica e difícil de
transmitir. A Terra aqui ferve, queima e parece que está a arder.
Quando olhamos para os lados vemos crateras e cones vulcânicos que se
sucedem uns aos outros. Vemos escoadas de lava que se estendem por vários
quilómetros. Esta paisagem parece não terminar e não há certamente adjectivos
que a qualifiquem com justiça.
Infelizmente não tínhamos tempo para fazer um trek maior (é possível
percorrer mais de 10 km nesta região) porque queríamos ver mais manifestações
vulcânicas em Krafla e em Myvatn. Sendo assim, fizemos um percurso de pouco
mais de 3 km, embora o tivéssemos alargado porque ainda fizemos algumas partes
de percursos limítrofes.
Seguimos viagem em direcção à cratera de Víti com mais de 300 m de
diâmetro e que esconde no seu interior um bonito lago vulcânico de águas negras.
Mas a exploração do vulcanismo de Krafla não ia ficar por aqui.
Terminamos com uma visita a Hverir, uma paisagem lunar de tons alaranjados e
pasteis, com fumarolas, lagoas sulfurosas e caldeirões de lama. Esta paisagem
tem muitas semelhanças com a paisagem das Furnas, nos Açores, embora aqui a
área seja bastante maior.
O dia estava a chegar ao fim e nós ainda tínhamos muita coisa para ver
na região de Myvatn. Iriamos subir crateras vulcânicas, explorar grutas de lava
e gelo, deambular por castelos de lava que albergam “seres misteriosos”, entrar
em grutas de água quente e percorrer cones vulcânicos nas margens do lago
Myvatn. Mas isso, é outra história.