Fish River Canyon, uma maravilha natural de África

A dimensão de um canyon é um tópico com algo de controverso, uma vez que a sua própria definição por vezes não inclui o caso de um canyon cavado em ambiente em montanha (ou seja rodeados de picos montanhosos), considerando-se que o canyon deve ser esculpido num plateau mais ou menos plano. Os canyons montanhosos maiores do mundo são necessariamente aqueles localizados na maior cadeia montanhosa do mundo, os Himalaias. Quanto aos canyons em plateau, o caso mais conhecido é o do Grand Canyon, nos EUA.


Depois de aceite a definição de canyon, segue-se o debate das suas dimensões. O que quer dizer ser o maior canyon do mundo? Em comprimento? Largura? Ou profundidade? Ou ainda em área total? Podem parecer pormenores técnicos que só os geólogos e geógrafos discutem, mas a verdade é que nas nossas viagens já passamos por vários canyons cuja publicidade turística anunciava como "o segundo maior canyon do mundo", partindo-se do princípio que o Grand Canyon seria o maior (na realidade, o Grand Canyon impressiona em termos de comprimento e largura, mas a sua profundidade máxima é ultrapassada por muitos outros canyons). São exemplo disso, o Canhão de Colca (Perú), o Canhão de Cobre (México) ou o Canhão das Três Gargantas (China), este último diminuído pela subida das águas devida à construção da barragem homónima, a maior do mundo.


Números à parte, no sul da Namíbia, encontra-se um dos maiores canyons (em plateau) do mundo, o Fish River Canyon. Sim, é verdade que este canyon tem cerca de 160 km de comprimento, uma largura máxima de 27 km e uma profundidade que atinge 550 m, mas quando estamos na sua presença, a mente esquece a quantificação e comparação e deleita-se no espectáculo que a natureza nos oferece. Sentimo-nos tão insignificantes em comparação com a escala desta beleza natural, que todas as questões de classificações e títulos perdem qualquer relevância.


Pode admirar-se esta maravilha da natureza de muitas formas. Os viajantes mais aventureiros podem experimentar o trilho de 5 a 9 dias que percorre grande parte do vale, enquanto os praticantes de desporto de alta-competição podem experimentar a ultra-maratona que aqui acontece todos os anos desde 2011. Nós limitamo-nos a admirar o canyon a partir da sua borda, caminhando alguns quilómetros ao pôr-do-sol.


A compreensão humana é também esticada para além dos seus limites quando tentamos abarcar as escalas de tempo envolvidas na génese de fenómenos naturais desta dimensão. Quantos milénios serão necessários para um rio escavar um vale desta dimensão, criando paredes de rocha quase verticais que desafiam as nossa vertigens?


Aqui a geomorfologia vem mais uma vez em nosso auxílio, tentando que as nossas mentes se ajustem a uma escala de tempo quase intemporal, a um ritmo próprio do Planeta, a uma cadência imprópria para seres mortais. Um mar interior terá aqui existido há mil milhões de anos, depositando o material que rodeia hoje o canyon e há cerca de 500 milhões de anos, intensa actividade tectónica abriu o que hoje admiramos como o canhão exterior, com patamares planos bem definidos a meio das vertentes inclinadas.


O canhão interior, mais profundo, e no fundo do qual corre intermitentemente o Rio Fish (durante o Verão mais propriamente uma série de poças, mas com o risco de cheias repentinas - flash floods - devido à chuva), foi sendo cavado pela acção das águas, acrescentando algumas centenas de metros à profundidade do canyon e criando a paisagem de outro mundo que os nossos olhos observam agora.


A ciência, o estudo da natureza, a curiosidade humana permitem-nos ter este conhecimento. Mas nada nos permite ter uma verdadeira noção das forças que moldam o nosso Planeta, dos éons de tempo que passam, do poder necessário à criação da paisagem que hoje nos rodeia. Mas isso talvez esteja só ao alcance dos Deuses que adoramos desde o alvor da Humanidade, e não seja matéria que deva ser vislumbrada por seres tão efémeros quanto nós. Resta-nos a oportunidade de podermos visitar e contemplar estas maravilhas naturais, e a capacidade de sentir a sua beleza, e sonhar com a sua génese. Somos efémeros, sim, mas também privilegiados! 

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